Sou esnobe - segundo os medíocres.
Vivemos em uma época estúpida, míope
e fraca. Época em que o importante é “ser feliz” - ou fingir que. Não basta ser
um bom profissional, bom cidadão, bom caráter; é mister fazer parte de
uma “equipe”, ser “bom colega”, “bom vizinho”, ser simpático e sorrir com
frequência alucinante.
A sociedade não aceita o triste,
o circunspecto, o calado, o misterioso - enquanto é complacente com o
sorridente, o falso, o fraco, o débil. “Não seja forte” - é o slogan dessa
campanha nefasta que se alastra pelo mundo como um vírus. Não seja você mesmo.
Em emprego recente, em escritório de advocacia renomado na cidade, soube - à
boca pequena, eis que essa gente só consegue falar na ausência - que era
considerada “esnobe”. Ora, direis, “esnobe”! Esnobe porque pronuncio
corretamente “erres” (r) e “esses” (s), uso os talheres de modo correto à mesa,
deleito-me com a língua portuguesa e não cedo em minhas convicções. “Esnobe”
porque gasto muito com roupas, mas minha biblioteca é maior que meu armário.
“Esnobe” porque não finjo sentimentos e sorrio apenas com sinceridade. “Esnobe”
porque meu interesse por filosofia é maior que por esmaltes - conquanto goste
de esmaltes também. “Esnobe” porque não sei o que está acontecendo nas novelas
da TV.
Ouvir isso foi interessante
porque não foi uma frase direta; foi: “os colegas acham você esnobe”. Ora,
direis, “esnobe”? Achei graça. Achei graça principalmente porque as pessoas que
podem ter dito a tal palavra nem mesmo sabem seu significado. Nunca a
procuraram em um dicionário. Desconfio de que usaram dicionários muito poucas
vezes na vida - é mais fácil perguntar aos “esnobes” o significado de
determinadas palavras [...].
Vamos ao significado de “esnobe”: Esnobismo é desprezar relações humildes, aferir méritos pelas
exterioridades, respeitar apenas quem possui grande prestígio e admiração
excessiva ao que está em voga.
Vejamos: no momento em que escrevo
este texto, meus melhores amigos são livros - ou crianças. Meus escritores
preferidos não eram moda em seu tempo, minhas músicas preferidas deixaram de
ser há muito e minhas palavras preferidas nem mesmo entram na moda.
Possuo absoluta aversão a eventos
sociais. Pessoas e lugares da moda me causam ojeriza. Não há lugar que goste
mais de estar que minha casa. Adoro pratos sofisticados e estrangeiros, mas meu
prato preferido é maionese. Gosto de vinhos, contudo, não dispenso
uma cerveja gelada.
Estou à disposição sempre para
ajudar. Indico livros, escrevo pareceres, envio modelos jurídicos, facilito um
contato, empresto livros - em último caso, deixo claro -, leio pareceres e
petições, empresto dinheiro, trato as pessoas com respeito, ajudo-as a realizarem sonhos, seguro portas,
ofereço lugar, dou preferência na passagem, levo pessoas para jantar, pago a conta do restaurante, gosto de dar presentes, fazer alguém se sentir importante. Importo-me com o outro; telefono, escrevo, retorno recados - sempre. Peço
licença e desculpas. Agradeço. E a palavra “por favor” segue sempre meus
pedidos. Isso não me faz perfeita, por óbvio. Apenas me ensina a sentir empatia - a empatia afetiva.
Pois bem. Descobri que as pessoas
chamam de “esnobismo” o que eu chamo de educação. Educação está tão em desuso
que quando usada ninguém sabe mais o que significa. Bom gosto virou sinônimo de
pedantismo. Triste um país que vive assim.
Sou cortês - e me incomoda
profundamente que confundam isso com intimidade.
Gosto de boa mesa, bons perfumes,
boas roupas. Gosto de grife - assumo. Inclusive nas pessoas. Pessoas com grife
são as que têm caráter, que tentam entender em vez de julgar, que têm mais a
oferecer que sorrisos dissimulados, possuem ideias e não têm medo de falar
sobre elas.
São pessoas “esnobes” na opinião
dos medíocres. Adoro Paulo de Tarso, o esnobe. Admiro os que não seguem a
multidão, que não são simpáticos apenas para granjear amigos. Na verdade, não
tenho paciência para fazer amigos. Sobretudo se eles não entendem o que é ter
educação.
Assim, guardo muitos de meus
conhecimentos somente para mim: Linguística, Teologia, Literatura, Filosofia,
Etimologia, Gastronomia, Música - e até Direito -, distribuo em doses mínimas.
Falo pouco. Nem mesmo vazo aqui esses desassossegos - não vale a pena.
O realmente triste nessa história
é que quem me julga esnobe têm acesso às mesmas escolhas que as minhas, mas prefere outro estilo; e as deixo seguir suas vidas sem julgá-las - só não posso deixar
de notar o quanto são medíocres.
- Dáuvanny Costa em texto escrito em jul/2013