domingo, 9 de abril de 2006

Quero e não quero

Não acredito mais na igreja. Estou separada dela. Estar "separado" da igreja, porém, não é estar separado de Cristo (mesmo porque Cristo não está na igreja). Meus olhos permanecem no Autor e Consumador da minha fé; mas já saíram da igreja há muito tempo. Em momento algum devemos pensar que a igreja representa o Senhor. Indigno-me. Indigno-me, contudo, com essa "igreja" venal, inconsequente, irresponsável, mercadejante, que vende a fé acenando com promessas mirabolantes de cura e prosperidade; quando Ele, de fato, nos ensina a carregar cruzes e renunciar a nós mesmos.
Paradoxos do presente século.
Estou cansada da igreja. Igreja que não salga. Descri dela como descreio do homem (homem aqui entendido como ser humano, por óbvio). Todavia, quanto mais estou em silêncio, mais me torno íntima do Senhor. E quanto mais busco a Deus, se torna inevitável: tenho de estar longe dos homens - que têm ofício de sal e não salgam, que pregam mais a si mesmos do que a Cristo.
Estamos vendendo a alma - contraditoriamente em nome de Deus. Tempos temerosos. Tempos de lamentações e, como meu profeta preferido (Jeremias) eu lamento. Lamento que não conheçamos a nossa alma, porque somos guiados pelos sentidos corporais; não entendemos o que é espiritual e vendemos a alma tão barato. Como escreveu Antônio Vieira devemos "aprender sequer do demônio a avaliar e estimar nossas almas" (Sermão das Tentações).
Os discípulos achavam que Jesus era o ‘salvador da pátria’ e os judeus O amaram e O seguiram por causa disso. Ele, pensavam, os libertaria da opressão de Roma, assim como havia libertado os seus pais da opressão do Egito. Antes, escravos do faraó; agora, escravos ainda. Escravos dos tributos, de César e da lei.
Mas Jesus não agiria assim! Ele não veio para isso.
Eles queriam vingança e Deus queria amor.
Eles queriam poder e Deus queria obediência.
Eles queriam libertação política e Deus queria libertação do pecado.
Eles queriam guerra e Deus queria a morte. Para vencê-la e ganhar a vida.
Quando descobriram que o reino de Jesus conduzia ao sofrimento, esconderam-se. Não era um trono que esperava por Ele. Era uma cruz. E assim é a igreja de hoje.
Dois milênios e ainda se procura o mesmo Jesus. O Jesus dos milagres.
Uma das coisas que Dostoiévski tem como objetivo mostrar em Os Irmãos Karamazov (a respeito do Grande Inquisidor) é que o paternalismo pode propiciar as condições de liberdade, mas pode, também, retirar a mesma liberdade: "Vê aquelas pedras naquele deserto árido? Muda-as em pão e atrás de ti correrá a humanidade, como um rebanho dócil e reconhecido, tremendo, no entanto, no receio de que tua mão se retire e não tenham eles mais pão".
A igreja não adora mais o Abençoador, adora as bênçãos. Estou separada dela. Minha fé é maior.
Fé esta que não está presa a promessas e milagres. Está presa com Ele; ainda que Ele me mate Nele esperarei. Faço minhas as palavras de Jó. Faço minhas as minhas palavras.
(Dáuvanny Costa)

Um comentário:

Lou H. Mello disse...

Um brado de uma inconformada! Como Gondim, Ruben Alves, você, eu e muitos mais, não há como aceitar os rumos da igreja de nossos dias. Mas, Ele voltará...