Há dores que não podem ser superadas.
Há dores físicas que machucam o corpo. Há outras que ferem a alma. Não há medicamentos que providenciem cura; não há chás, xaropes ou poções mágicas para aliviar o peso sobre os ombros; o cansaço mental; as saudades que perfuram o coração quebrando-o em pedaços incontáveis como uma britadeira cruel; a espera; a ausência; as noites de insônia; a agonia disfarçada; o sorriso forçado do cotidiano; as perguntas sem respostas. Essa dor vaza em oceanos de lágrimas regando incertezas.
Até quando?!... é o grito desesperado que rasga nossas gargantas.
Até quando?... é o gemido que nossos lábios balbuciam.
Até quando se contabilizarão amanhãs não vividos?
Há dores silenciosas que se escondem pelos recônditos de nosso ser nos fazendo mentir ao coração covarde. Há outras que explodem, vulcânicas; derretendo-nos.
Essas são as dores em mim. Ambas. Dor da Beth Metynoski, da Lenice Café, do Jorge Damus, da Elizabeth Andrade, dos pais do João Hélio, da Rachel Costa, da Ieda Vale, da Maria Lopes, dor da esposa, da mãe ou da filha que moram na casa da esquina e passam por mim com olhos baixos e tristes sem eu nunca ter ousado perguntar o motivo. Dor de perdas estúpidas, de indignação, de impotência.
Dor pela banalidade da violência, pelo descaso com a vida humana - com a vida amada, pela imoralidade, pela falta de valores.
Dor pelo que está sendo e pelo que teria sido, pela corrupção e pela corruptibilidade, por ser um grão de areia tão pequeno, bem menor que o mar de lágrimas.
Dor pelas crianças que partem - e pelas que nascem; pelas mães à beira das sepulturas de quem elas ensinaram a andar; dor pelos filhos sem pais e sem respostas; dor pelas jovens esposas que não conjugam o verbo amar no passado.
Até quando assistiremos atônitos e silentes essas agressões à nossa humanidade?!
Até quando a indignação das massas só durará 24 horas?!
Como é concebível que bandidos de mira precisa, torturadores, estupradores, cruéis destruidores de vida, sejam considerados e tratados como crianças? Como é concebível que o Estado tutele com mais zelo os algozes que as vítimas? Como leis que supostamente deveriam proteger a sociedade a exponham ao ridículo, à insegurança e ao medo, sendo tão lenientes e inconseqüentes?
Procurei essas respostas. Ei-las. Em minha visão:
Nosso consentimento.
Consentimos na corrupção política, na venalidade judiciária, no 'jeitinho brasileiro', no político desonesto, na venda de votos, nas leis promulgadas, nos preços cobrados, nas grades nas janelas, nos alarmes nos carros, nas crianças em apartamentos, na nossa falta de poder.
Consentimos nos juros bancários, na falta de emprego, nos impostos exorbitantes, na falta de ética, nas mentiras comunistas, nos movimentos humanistas e estúpidos, no desrespeito às Polícias, no uso de drogas.
Consentimos com os programas de tv que fazem apologia a tudo - menos à moral, com a desigualdade, com as notícias dos jornais, com as filas nos hospitais, com a escola sem mestres, com a criança sem infância, com a fome dos índios, com a seca do Nordeste, com a farra do boi, com o desmatamento da Amazônia, com o roubo na casa ao lado.
Somos coniventes. Não agimos ou reagimos. Letargia coletiva que se apodera do povo, enquanto o sangue dos justos rega essa terra impura. O que fazer para mudar? Apontamos problemas, mas não soluções.
Solução é o fim do "alto clero político".
Disse "alto clero", quando deveria ter dito "baixo meretrício". E nem preciso explicar o porquê.
(Dáuvanny Costa)