quinta-feira, 29 de setembro de 2011

E se?...

Durante mais de 15 anos, impacientes com o nepotismo e a lentidão, a sociedade, o Executivo e o Congresso defenderam o controle externo do Poder Judiciário. O país se mobilizou. O Judiciário foi contra. Negociou-se a criação do CNJ, o controle de juízes, feito por uma maioria de juízes, com representantes de outros setores. O CNJ resulta deste acordo. É um contrato entre Congresso, Executivo, sociedade civil e o próprio Judiciário, a favor da ética e da eficiência judiciais.
Hoje, a Associação dos Magistrados Brasileiros pressiona o Supremo para romper unilateralmente este contrato. Querem retirar o poder do CNJ de julgar e punir os juízes como manda a Constituição. Pretende-se transformar o CNJ em conselho honorário. Não mais uma responsabilidade democrática.
Este objetivo político reveste-se de argumentos aparentemente constitucionalizados, mas no fundo contrários à Constituição. O contrato político que criou o CNJ foi formalizado no artigo 103 B da Constituição, que concede ampla competência ao CNJ para receber qualquer reclamação contra os juízes, sem nenhuma condição. Qualquer do povo pode ir ao CNJ. Não precisa ir antes ao Tribunal local, como quer a AMB. O Congresso deu ampla competência até para de ofício apurar irregularidade. Pode agir por iniciativa própria sem nem mesmo ter denúncia de terceiros. Esta ampla competência constitucional é garantia da própria magistratura. O CNJ a exerce com parcimônia.
Agora, alguns pretendem extinguir o CNJ, deixando-o vivo. Lembro-me de Plutarco, quando disse: a pior das justiças é aquela que é injusta, mas parece justa. O pior CNJ é aquele que inexiste, mas parece existir.
O ataque é indireto. Inexiste um só dispositivo na Constituição que diretamente fundamente a decisão de, em nome da autonomia do tribunal, limitar-se o CNJ. A autonomia dos tribunais não é absoluta. Na democracia não há autonomias absolutas. Ao aprovar a emenda 45, que criou o CNJ, o Congresso disse claramente que seus poderes são compatíveis com os dos tribunais. O próprio Supremo, ao confirmar a constitucionalidade do CNJ em 2005, também.
A encruzilhada levada ao Supremo é falsa. A competência do CNJ não é incompatível com a das corregedorias dos tribunais. Uma não elimina a outra. São concorrentes, como afirma Ayres Britto. Na democracia, quanto mais controle a favor da ética e da eficiência, melhor. A demanda é política e corporativa . Foi derrotada ontem, quer ressuscitar hoje.
A decisão do Supremo não é sobre a morte em vida do CNJ. É sobre valores éticos e sociais. Estão em jogo a concretização da imparcialidade no julgar e a liberdade do cidadão de ir contra os poderosos do momento. Como exigir de um advogado processar um desembargador no mesmo tribunal, a quem mais tarde terá de recorrer no exercício de sua profissão? Onde e como estes valores – a imparcialidade no julgar e a liberdade de denunciar irregularidades – podem melhor ser concretizados: nas corregedorias locais ou no CNJ? Ou nas duas, concorrentemente?
O dano está feito. As consequências da nova pauta serão maior atrito entre os poderes. Entre os magistrados e os demais profissionais jurídicos. Uma mídia mais atenta e investigativa em denúncias. Mobilização congressual. Confiança decrescente na Justiça. O CNJ de alguma maneira apaziguava. Tinha alguém imparcial atento a favor da ética e da eficiência. E agora?
(Joaquim Falcão, professor de Direito Constitucional da FGV-Rio in O Globo de hoje).

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Esperanças Falidas. Lá e Cá.

De uma maneira ou de outra, todos os que vivemos nesta pátria tão convulsionada estamos expostos a altíssimos níveis de ansiedade, stress e impotência, sob as imensas nuvens negras com as quais amanhecemos e anoitecemos.
Nestas semanas temos lido e ouvido, insistentemente, acerca do termo falido. Fala-se que Honduras é um Estado falido, que o governo é falido, que a cidadania está falida, enfim, uma cadeia de falhas que me permitiram acrescentar mais uma ao elo: esperanças falidas.
De uma maneira estrepitosa temos contemplado como nos últimos anos muitas de nossas esperanças se esfumaram até se converter em falidas. A morte e o narcotráfico cavalgam dia e noite por todo o território nacional. Como nunca, contemplamos crimes horrendos que, por já serem tão comuns, nos insensibilizou e os adotamos, infelizmente, como parte natural e cotidiana da realidade.
A falta de emprego é o passaporte para que já não só jovens e camponeses, mas também adultos mais velhos e profissionais, estejam abandonando o país em busca de um futuro mais promissor e esperançoso do que se pode ter aqui. Que pena que compatriotas continuem brincando com o destino pela miopia, ambição e o egoísmo de nossos pseudo-dirigentes!
Por qualquer lente que se olhe, nota-se o caos no qual estamos afundados. O sistema educacional público é uma fogueira desde há anos, onde a única coisa que soma no mesmo é a perda irrecuperável de aulas. Infortunadas crianças e jovens alunos! Espera-lhes um futuro torrencial, onde não terão oportunidades mínimas pois não aprenderam nada: seu conhecimento é paupérrimo, nunca lhes ensinaram como desenvolver destrezas e jamais lhes transmitiram valores, já que, antes, se lhes alentou a formar turbas de rua que destroem tudo em sua passagem.
Do mesmo modo, a saúde pública encontra-se em estado de calamidade. Não há remédios, material nem equipamentos cirúrgicos... é tanta a demanda que pouco se pode fazer pelas longas filas de necessitados e doentes.
O mais demolidor de todas estas sombras que turvam o horizonte, é a atitude irresponsável e patética que a Klasse Polítika continua predicando. Esta não amadureceu em absoluto, nem aprendeu um milésimo com o passado recente no qual quase se enterra a República. Convocam as pessoas para escutá-la, quando a gritos expressaram suas carências. Para que falar tanto se os estômagos não podem continuar esperando? Para que estar em reuniões bizantinas, se o que se deseja é viver em paz e não morrer a cada dia?
Necessita-se de trabalho, educação, saúde, moradia, segurança para avançar e não para retroceder.
Não é com constituintes nem com documentos promulgados por indivíduos que acreditam ser semi-deuses, que se iluminará e resolverá o caminho. As palavras, os discursos, os grandes eventos são parte de um marketing que ficou como imagem congelada nos espelhos, pois não produziram os resultados esperados. Quem vai querer investir num país com a insegurança jurídica e física na qual se vive? Como operarão empresas que gerem riqueza, se nem sequer respeita-se a Constituição da República nem a divisão de poderes?
Já estão ficando até sem valores os que devem ser o reflexo ideal para as diversas gerações. Pratica-se de forma cínica a traição e a deslealdade. Corta-se com a guilhotina da infâmia a cabeça daqueles que nas horas boas e, sobretudo, nas más, foram nossos sinceros amigos. Estabelecem-se laços de amizade com outros que não nos deixaram nada, e que nem sequer sabem como se pronuncia o nome do nosso solo.
As esperanças das classes média e baixa já estão falidas. Não se vê a saída por nenhuma esquina. Tudo está contaminado a tal ponto, que a Klasse Polítika se imiscuiu em todos os ambientes públicos e privados, chegando inclusive a dobrar até os intelectuais e a academia, que se vêem intimidados pelas diretrizes da corrupção.
Esperanças falidas quando se comprova que cada vez mais se distancia a estrela que nos orientará para sair da pobreza, pois o gasto público aumentou, a burocracia cresce aceleradamente com a criação de secretarias de Estado decorativas e de escassa incidência no âmbito nacional. Ademais, as viagens burocráticas improdutivas com numerosas comitivas a nações estrangeiras, deixam que a imaginação comece a navegar.
Esperanças falidas ao descumprir com um povo que, com valentia, ante ameaças e intimidação, saiu um inseguro domingo de novembro de anos atrás, a exercer o sufrágio maciçamente para continuar vivendo em democracia.
Esperanças falidas quando os cidadãos honrados e íntegros contemplam estupefatos como se alenta e venera desde o poder público os delinqüentes de colarinho branco, os anarquistas e virulentos que encarnam a força bruta, e os vende-pátria de ontem e de hoje, ao oferecer-lhes todo tipo de honrarias, concessões e estímulos de protagonismo. Premia-se-os por haver tratado de destruir a nação!
Sentimo-nos sem rumo, sem bússola e respira-se, em geral, uma sensação estranha de certeza de que nos encaminhamos ao despenhadeiro, à agonia pátria, pois tudo indica que naquele governo hondurenho lacaio do imperador sul-americano, não se extirpou definitivamente o câncer que circulava pelas células da República.
As únicas duas esperanças que não estão falidas são a capacidade de resposta de uma sociedade que nestes momentos, inexplicavelmente, brilha desarticulada e temerosa. A outra é a fé em Deus, esse Deus que nunca nos abandonou e que sempre estará com Honduras até o fim dos tempos.

Nota da tradutora: Eis aqui um artigo magnífico de um cidadão de Honduras que poderia muito bem estar se referindo ao Brasil.
(Tadutora: Graça Salgueiro in Mídia sem Máscara)

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Apenas

"Enfrentar o crime com rigor e o criminoso com a força integral de uma lei penal compatível com a realidade do país, é exigência da ordem pública, com a qual não se brinca nem se transige impunemente. Em alarmante freqüência, bandidos perigosos são liberados para atividades externas ou tendo cumprido somente parte insignificante da pena. Quando soltos, matam, estupram, assaltam". (Percival Puggina)